Jogar RPG é como ler um livro. Mas ao invés de
lermos sobre o que fazem as personagens, escolhemos precisamente quais serão
suas reações diante dos mais variados cenários. É interessante notarmos como a
vida imaginada em um cenário diferente, mesmo que minimamente, de nosso
dia-a-dia presenteia os jogadores com uma sensação de liberdade.
Dependendo do narrador essa sensação pode ser
potencializada ou minimizada, veja: quando o mestre de mesa tende a narrar em
um tom épico - em que os personagens são levados a decidirem por si o destino
do próprio universo, mundo ou país - os jogadores normalmente tendem a ser um
pouco mais desleixados quanto as consequências de suas ações; conquanto se o
narrador for mais rigoroso e a história estiver mais próxima a realidade aplicável
- em que mal podemos controlar os nossos destinos diários, que dirá de todo o
universo, mundo, país - os jogadores, temerosos por perderem-se em um mundo de
infâmia cotidiana acabam por prestar mais atenção nas atitudes que estão
assumindo junto de seus personagens.
Os dois estilos de narrativas tem seus benefícios
e malefícios. A narrativa épica tende a ser envolvente, porém deixa passar
muitos detalhes que poderiam fazer toda a diferença, normalmente ela trabalha
por uma prática de criação de um nêmeses e o combate entre forças opostas (bem
x mal, paz x guerra, caos x ordem). A narrativa mais realista tende a ser mais
preciosa em detalhes, porém ela não consegue expandir-se para muito além do
universo em que os personagens já estão envolvidos. Em ambos os casos o limite
da história é a imaginação de narrador e jogadores somada.
Em nosso grupo temos os dois tipos de narradores.
O Daniel é muito detalhista e realista, enquanto este que vos fala é absolutamente
épico em sua narrativa. O Thiago é um meio termo entre esses polos. Sendo muito
prático, suas narrativas acabam por explicitar exatamente o que é necessário
para que seus personagens sejam heróis sem a necessidade de colocá-los em
situações absurdas que confrontam o tom épico com a realidade. Em suma o Thiago
cria um universo e aceita que dentro das regras daquele mundo cabem
idiossincrasias que nem eu, nem o Daniel somos capazes de conceber.
Quando fomos mestrar nossa primeira aventura no
colégio Emilie de Villeneuve, o trio fundador deste grupo se reuniu para pensar
em uma aventura que a um só tempo transportasse as crianças do quinto ano para
o século XVII e que lá elas pudessem viver e compreender como era a vida
durante o período de grande mineração no interior do Brasil. Era necessário que
a narrativa fosse divertida, mas cheia de conteúdos práticos sobre a vida
naquele período. Nossas mãos não estavam amarradas por quaisquer conteúdos,
elas eram livres para desenhar para aqueles jovens alunos o interesse que
resolvêssemos dar ao mundo [do século XVII].
Não foi uma preocupação expressa que eles
separassem a brincadeira do conteúdo, mas combinamos que sempre pontuaríamos,
durante a aventura quais eram os conteúdos de sala de aula que estávamos
trabalhando ali. E foi muito gratificante trocarmos
notas sobre as reações dos alunos e os tratamentos que estávamos dando à
história. Em minha memória guardo com carinho cada um dos jogadores e mais tudo
o que eles me ensinaram enquanto eu tentava ensinar-lhes algum conteúdo de sua
aula de história. Educação é uma via de duas mãos e reunir esse belo ato de
trocar com a potência da imaginação de nossos alunos é uma experiência que todo
professor deveria passar por em sua carreira.
A aventura continua aqui
A aventura continua aqui
Muito legal. Parabéns pela iniciativa. Eu gosto dos dois tipos de narrativa e acredito que um meio termo entre as duas seria o ideal.
ResponderExcluirA idéia de usar o RPG como ferramenta educativa também é uma grande sacada porque atrai a atenção dos jovens alunos. Parabéns ao grupo Interpretar e Aprender. Desejo sucesso na empreitada e que essa idéia receba apoio e patrocínio. Parabéns Thiago.