O grupo “Interpretar e Aprender” surgiu como ideia nos corredores da Universidade de São Paulo por três estudantes de História interessados em integrar diversão e aprendizagem. Apaixonados tanto por narrativas fantásticas quanto pelo ato de ensinar, estes amigos decidiram criar um grupo cujo intuito seria trabalhar, de forma prazerosa, os conteúdos escolares - e não haveria melhor maneira de fazê-lo do que utilizando o RPG, ou Role Playing Game.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

A aventura de se fazer aventuras... ou como começamos


Jogar RPG é como ler um livro. Mas ao invés de lermos sobre o que fazem as personagens, escolhemos precisamente quais serão suas reações diante dos mais variados cenários. É interessante notarmos como a vida imaginada em um cenário diferente, mesmo que minimamente, de nosso dia-a-dia presenteia os jogadores com uma sensação de liberdade.
Dependendo do narrador essa sensação pode ser potencializada ou minimizada, veja: quando o mestre de mesa tende a narrar em um tom épico - em que os personagens são levados a decidirem por si o destino do próprio universo, mundo ou país - os jogadores normalmente tendem a ser um pouco mais desleixados quanto as consequências de suas ações; conquanto se o narrador for mais rigoroso e a história estiver mais próxima a realidade aplicável - em que mal podemos controlar os nossos destinos diários, que dirá de todo o universo, mundo, país - os jogadores, temerosos por perderem-se em um mundo de infâmia cotidiana acabam por prestar mais atenção nas atitudes que estão assumindo junto de seus personagens.
Os dois estilos de narrativas tem seus benefícios e malefícios. A narrativa épica tende a ser envolvente, porém deixa passar muitos detalhes que poderiam fazer toda a diferença, normalmente ela trabalha por uma prática de criação de um nêmeses e o combate entre forças opostas (bem x mal, paz x guerra, caos x ordem). A narrativa mais realista tende a ser mais preciosa em detalhes, porém ela não consegue expandir-se para muito além do universo em que os personagens já estão envolvidos. Em ambos os casos o limite da história é a imaginação de narrador e jogadores somada.
Em nosso grupo temos os dois tipos de narradores. O Daniel é muito detalhista e realista, enquanto este que vos fala é absolutamente épico em sua narrativa. O Thiago é um meio termo entre esses polos. Sendo muito prático, suas narrativas acabam por explicitar exatamente o que é necessário para que seus personagens sejam heróis sem a necessidade de colocá-los em situações absurdas que confrontam o tom épico com a realidade. Em suma o Thiago cria um universo e aceita que dentro das regras daquele mundo cabem idiossincrasias que nem eu, nem o Daniel somos capazes de conceber.
Quando fomos mestrar nossa primeira aventura no colégio Emilie de Villeneuve, o trio fundador deste grupo se reuniu para pensar em uma aventura que a um só tempo transportasse as crianças do quinto ano para o século XVII e que lá elas pudessem viver e compreender como era a vida durante o período de grande mineração no interior do Brasil. Era necessário que a narrativa fosse divertida, mas cheia de conteúdos práticos sobre a vida naquele período. Nossas mãos não estavam amarradas por quaisquer conteúdos, elas eram livres para desenhar para aqueles jovens alunos o interesse que resolvêssemos dar ao mundo [do século XVII].
Como sempre foi e sempre será, o tirânico Daniel (estão vendo como eu tenho uma verve épica?) tentou impor a realidade massacrante a história que contaríamos. Eu e meu fiel ajudante Robin, digo Thiago... digo grande companheiro Thiago rapidamente levantamos nossas vozes contra a tirania da não imaginação e fomos vitoriosos. Brincadeiras a parte, a experiência de criar pensando em como entrelaçar na imaginação dos alunos as densas relações sociais, políticas e econômicas em uma trama foi um desafio. Tivemos algum trabalho em criar um enredo em que interesse econômico, humano e social fosse inteligível e verossímil. A atitude que assumíamos naquele momento era política e para tanto tivemos de criar regras e diretrizes para que os jogadores participassem sem que perdêssemos muito tempo explicando como funcionaria o jogo.

Não foi uma preocupação expressa que eles separassem a brincadeira do conteúdo, mas combinamos que sempre pontuaríamos, durante a aventura quais eram os conteúdos de sala de aula que estávamos trabalhando ali. E foi muito gratificante trocarmos notas sobre as reações dos alunos e os tratamentos que estávamos dando à história. Em minha memória guardo com carinho cada um dos jogadores e mais tudo o que eles me ensinaram enquanto eu tentava ensinar-lhes algum conteúdo de sua aula de história. Educação é uma via de duas mãos e reunir esse belo ato de trocar com a potência da imaginação de nossos alunos é uma experiência que todo professor deveria passar por em sua carreira.

A aventura continua aqui

Um comentário:

  1. Muito legal. Parabéns pela iniciativa. Eu gosto dos dois tipos de narrativa e acredito que um meio termo entre as duas seria o ideal.
    A idéia de usar o RPG como ferramenta educativa também é uma grande sacada porque atrai a atenção dos jovens alunos. Parabéns ao grupo Interpretar e Aprender. Desejo sucesso na empreitada e que essa idéia receba apoio e patrocínio. Parabéns Thiago.

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