Depois da cena, eu fiquei me perguntando o porquê de eu não ter me utilizado de alguma maldição, o porquê de eu não ter intimidado o agressor (a habilidade mais relevante da personagem!), o porquê de eu ter interpretado um entristecimento ao invés de dar vazão à fúria (defeito descrito na ficha da personagem!). Imediatamente me ocorreu: "será que é porque estava interpretando uma mulher?". Será que, se eu estivesse interpretando um herói, eu teria tido a mesma reação? Ou mesmo se eu estivesse interpretando um não-combatente, ou um pacifista homem, teria tido a mesma reação? Esta pergunta ficou me incomodando por um tempo, ao mesmo passo que outra foi surgindo: será que ele teria desferido um tapa, ao invés de outro tipo de golpe, por conta do gênero das personagens?
Uma das coisas mais legais do RPG é a possibilidade de interpretar personagens, mas também é um exercício interessante para que nos conheçamos melhor - só assim podemos nos corrigir, afinal. Às vezes, acabamos agindo de formas impensadas e não temos em mente as implicações infelizes de tais ideias e o RPG nos fornece a capacidade de colocar algumas destas ações em perspectiva.
Assim, pensando agora, eu não poderia ter agido como agi. Deste modo, deixei de reagir como uma bruxa poderosa e furibunda, como seria mais coerente com a personagem havia criado, para dar lugar a uma donzela indefesa, marca da representação degradante das mulheres nos universos fantásticos, ou, pior, uma mulher incapaz, quando ela foi pensada como uma mulher hiper-competente, respeitada e temida. Minha "tristeza" acabou destruindo todo o trabalho que tive na criação e elaboração de uma personagem mulher que não fosse meramente redutível a seu gênero - mesmo sendo uma bruxa.
O RPG permite uma recriação da história e, com isso, por que diabos utilizá-lo para reforçar estereótipos, arquétipos e injustiças quando podemos fazer do mundo (de todos eles!) um lugar melhor? Verossimilhança é sempre interessante, mas, já que é impossível fugir do anacronismo, por menor que ele seja, será que não é mais legal se utilizar do anacronismo justamente para dar espaço a um mundo menos equivocado do que o nosso onde possível?
Talvez, historicamente, fizesse mais sentido que, ali, desmascarada em seu poder, os nórdicos deixassem de temer aquela forma de bruxaria e, com isso, se abrisse mais espaço para outras tradições religiosas. Talvez. Mas será que o que importa, no caso, é sempre a história? Finalmente, sugiro a leitura da dissertação de Mestrado de Eliane Godinho, Role Playing Game - Uma representação de gênero, que suscita ótimas reflexões não só sobre o tema, mas sobre o percurso do RPG.
Olha, eu também fiquei com essa impressão depois. Mas houveram razões para o vento ter feito o que fez....hehehehe
ResponderExcluirOlha o mestre se justificando e dando spoiler kkk
ResponderExcluirHahahaha, ele até explicou ontem!
ResponderExcluirMas, no mais, foi muito legal!
=D