O grupo “Interpretar e Aprender” surgiu como ideia nos corredores da Universidade de São Paulo por três estudantes de História interessados em integrar diversão e aprendizagem. Apaixonados tanto por narrativas fantásticas quanto pelo ato de ensinar, estes amigos decidiram criar um grupo cujo intuito seria trabalhar, de forma prazerosa, os conteúdos escolares - e não haveria melhor maneira de fazê-lo do que utilizando o RPG, ou Role Playing Game.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Mas, afinal, como funciona este tal RPG?

"Vocês finalmente chegam ao povoado", disse o Narrador, em um tom enigmático e ligeiramente sôfrego. "Há dias que vocês viajavam, passando por trilhas difíceis, passagens perigosas e por dias de privações. Desde que saíram do litoral, vocês não puderam comer direito, dormir direito ou descansar direito. Enquanto subiam a muralha florestal, conforme trilhavam caminhos pelos morros, mosquitos e pernilongos os escoltavam, ao passo que o sol do verão ardia em vossas peles, mesmo debaixo de sombra e protegido com chapéus e roupas grossas. Era comum que se chamasse o interior destas terras de Inferno Verde. Nenhum de vocês poderia dar um nome melhor ao local. Agora, contudo, o pior já passara. Finalmente vocês chegavam a São Paulo do Piratininga - e poderiam se dar por sortudos: sequer atacados pelos gentios vocês foram".

"Antes de subirem, Guairá, que já iria percorrer o caminho de qualquer forma, guiava Lopes de Azevedo em troca de alguns vinténs, quando foram interpelados por D. Armindo. D. Armindo estava ao lado de dois capatazes exaustos e algumas caixas. Em troca da ajuda de Guairá e Lopes, D. Armindo prometeu hospedagem e hospitalidade em suas terras para ambos", terminou, finalmente o Narrador.

Lucas pegou sua ficha e olhou para o nome de sua personagem. 'Lopes de Azevedo', estava escrito. Parecia um tanto... sem graça, mas o Narrador pedira para que escolhesse um nome que parecesse bem português. O nome do personagem do Philippe lhe parecia mais legal: 'Guairá'. Parecia nome de estrada ou de rua, mas soava bem mais... fantástico. Bem, Lucas havia criado um ex-oficial do exército português tentando uma nova vida na colônia - não dava para ter um nome muito fantástico mesmo. Já Philippe optara por um guaianás que buscava se vingar dos guerreiros de uma aldeia de origem tupi próxima da pequena vila no Planalto de Piratininga. Segundo o Narrador, à época, a nação tupi de Tibiriçá (confundida, por vezes, com os guainases) era aliada dos portugueses . Já o outro jogador, Caio, criara 'Dom Armindo de Andrada Gouveia Coelho", um colono nobre e rico que viera da capitainia de São Vicente para ver como estavam suas propriedades sobre a Serra do Mar. 

Caio olhou para sua ficha, que o descrevia como uma figura desonesta e maliciosa e deu um sorriso. Disse então: "Quando chegamos às minhas terras, eu digo: 'Bem, chegamos cá. Sou muito grato aos senhores e, como prometido, hospedarei-os e serei hospitaleiro quando quiserem'. Aponto então para um lugar a céu aberto, no meio do mato do interior da propriedade e falo, parecendo generoso: 'Vocês podem dormir aqui!'". Lucas e Philippe arregalam os olhos e quando iam reclamar, o Narrador orientou: "Bem, ele é o dono da propriedade e não seria muito sábio, para um homem da época, contestar e enfrentar um nobre, muito menos em suas terras". Resmugaram um pouco, para diversão de Caio e continuaram com o jogo.

"Algumas dias depois depois, Lopes finalmente conseguira um emprego: como sabia ler, escrever e fazer contas, passou a trabalhar na Câmara Municipal, que, segundo o Narrador, na época se chamava Casa do Conselho. Já Guairá, sedento de vingança, procurou descobrir onde estavam seus inimigos. Enquanto isso, D. Armindo logo ficou mais interessado em sua amizade com o ex-oficial Lopes. Tudo ia muito bem, até que, repentinamente, liderados pelos Tupinambás, os nativos da Confederação dos Tamoios atacaram a Vila!", descreveu o narrador, animado. Agora, terminada a introdução, a aventura começava de verdade para eles. Quando disse que iria fazer uma aventura que se passava no Brasil, os jogadores não pareciam muito excitados. Agora, depois de uma tarde inteira estudando história, o esforço parecia estar valendo a pena... 

2 comentários:

  1. Eu tava te devendo um comentário aqui, né?
    Cara...o primeiro parágrafo terminou me surpreendendo, dai eu saquei o que tava acontecendo. Mas, pra quem não sacou, o fim do texto surpreende de um jeito mais gostoso ainda.

    Sério, achei muito legal essa ideia de ensinar História com RPG. Pensei que outras disciplinas podiam ser ensinadas...acho que Literatura só, né? Mas daria muito certo com as duas. É genial.

    A gente se pega sabendo mais sobre a Terra Média do que sobre a América Latina. Mais sobre a geopolítica de Game of Thrones do que sobre a guerra Israel-Palestina.

    Usar algo extremamente próximo aos livros, séries, desenhos e filmes que a gente gosta, o RPG, para ensinar é sensacional. Fiquei com vontade de ter tido aulas assim. Acho que agora não da mais tempo, só vou poder ensinar assim. Mas com certeza vai ser divertido também hahaahhahahaha

    Mas tem uma coisa...quem for narrar tem que estudar MUITO a época e o lugar. Não acha? Mas depois disso, é só deixar rolar. Muito bom.

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    1. O narrador tem que estudar MUITO sempre que for narrar! haha No caso de professor@s narrador@s já tá estudado, afinal, já demos aula sobre os conteúdos.

      Dá pra ensinar diversas outras disciplinas sim! Geografia Biologia e Literatura são bem fáceis, as exatas são mais complexas de inserir, mas também é possível. Afinal, para abrir o alçapão do navio que acabaram de abordar, precisam calcular a força da alavanca!

      Valeu pelo comentário (4 anos depois) =D

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